Uma operação da Polícia Federal (PF) desarticulou um esquema de fraudes em concursos públicos que atuava há mais de uma década em diversos estados. O grupo, com base em Patos (PB), funcionava como uma estrutura familiar e chegou a cobrar até R$ 500 mil por vaga, segundo as investigações.
A ação, batizada de Operação Última Fase, foi deflagrada na última quinta-feira (2) e cumpriu mandados de prisão e de busca e apreensão em quatro estados. A quadrilha usava tecnologia avançada para burlar sistemas de segurança, com o uso de dublês, pontos eletrônicos implantados cirurgicamente e comunicação em tempo real durante as provas.
Estrutura familiar e liderança
De acordo com a PF, o grupo era liderado por Wanderlan Limeira de Sousa, ex-policial militar expulso da corporação em 2021. Ele coordenava toda a logística do esquema, negociava com candidatos e distribuía os gabaritos das provas.
A quadrilha incluía irmãos, sobrinhos e cunhados, cada um com funções específicas, desde o recrutamento de interessados até a entrega das respostas. Entre os envolvidos está Larissa de Oliveira Neves, sobrinha de Wanderlan, que foi aprovada no Concurso Nacional Unificado (CNU) e usada como “vitrine” para atrair novos participantes.
Segundo a investigação, o próprio Wanderlan se inscreveu no CNU de 2024 para demonstrar a eficiência do método. Ele chegou a ser aprovado para o cargo de auditor fiscal do trabalho, com salário inicial de R$ 22,9 mil, mas não compareceu ao curso de formação.
Pagamentos e corrupção
As fraudes eram negociadas conforme o cargo e o nível de dificuldade da prova. Além de pagamentos em dinheiro, o grupo aceitava propina em ouro, veículos e até procedimentos odontológicos.
Entre os suspeitos estão Ariosvaldo Lucena de Sousa Júnior, policial militar e dono de uma clínica usada para lavagem de dinheiro, e Thyago José de Andrade, responsável pelos repasses e empréstimos para pagamento de subornos.
A PF também investiga a advogada Laís Giselly Nunes de Araújo, de Recife, suspeita de fraudar pelo menos 14 concursos, entre eles o do Tribunal de Contas de Pernambuco (TCE-PE), cujo resultado foi suspenso.
Provas e fraudes em diversos concursos
A investigação reuniu provas técnicas que apontam coincidência total nos gabaritos de quatro candidatos, incluindo Wanderlan e familiares. Um laudo da Fundação Cesgranrio indicou que a chance de coincidência casual é equivalente a ganhar a Mega-Sena 18 vezes seguidas.
As fraudes alcançaram concursos da Polícia Federal, Caixa Econômica Federal, Polícias Civil e Militar, UFPB, Banco do Brasil e o próprio CNU.
Em interceptações telefônicas, Wanderlan e o filho, Wanderson Gabriel, discutiam estratégias para fraudar o concurso nacional. “A nossa comissão vai ser lá no CNU. Vou batalhar pra nós, ver se nós consegue na poiva (dinheiro)”, disse Wanderlan em áudio gravado em 4 de junho de 2024.
Lavagem de dinheiro e prisões
Relatórios do Coaf mostraram movimentações financeiras incompatíveis com a renda dos investigados. A cunhada do líder, Geórgia de Oliveira Neves, teria depositado R$ 419 mil em espécie, apesar de não possuir vínculo formal de trabalho desde 1998.
Parte dos valores era disfarçada em transações de imóveis e veículos, com o uso de laranjas e contratos falsos. Em um dos casos, uma motocicleta foi usada como pagamento de propina em um concurso da Caixa Econômica Federal.
Até o momento, três pessoas foram presas preventivamente, duas em Recife e uma em Patos. Nenhum dos principais investigados chegou a tomar posse nos cargos públicos.
Investigações em andamento
A PF e o Ministério Público Federal (MPF) seguem rastreando os fluxos financeiros e apurando o envolvimento de servidores públicos. Em decisão judicial, o juiz Manuel Maia de Vasconcelos Neto, da Justiça Federal da Paraíba, destacou que a quadrilha “atuava com divisão de tarefas e cobrava cerca de R$ 300 mil por vaga”.
Até o momento, não há indícios de envolvimento direto das bancas organizadoras. As investigações continuam para identificar possíveis intermediários e profissionais da saúde que prestavam suporte logístico ao grupo.
As defesas dos investigados negam as acusações e afirmam que não há provas que liguem os suspeitos às fraudes apontadas.
Com informações do Info Money.

